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sexta-feira, 27 de agosto de 2010

MENSTRUAÇÃO SAGRADA


por Monika von Koss

"Menstruar é um facto central na vida de qualquer mulher. Das diferenças que existem entre homens e mulheres, 'sangrar sem morrer' certamente é uma das mais significativas e que deixou forte impressão na mente humana, desde o primórdio dos tempos. Para as nossas ancestrais da Idade da Pedra, o sangue menstrual era sagrado. A palavra sacramento provavelmente tem origem em sacer mens, literalmente, menstruação sagrada.

Menstruação significa "mudança de lua". Tem como sílaba-raíz mens, mensis, e está na origem da contagem do tempo. Forma palavras como medida, dimensão, metro, mente, para citar algumas.

O sangue menstrual, representando o poder de criar vida que conecta as mulheres com o próprio universo, era tabu, palavra polinésia significando "sagrado" e "proibido". Nas sociedades tribais, a menarca, o início do fluir do sangue, era celebrado com um rito de passagem, auxiliando a menina a realizar a sua entrada para o reino do mana: o poder sagrado transmitido pelo sangue e que tanto podia dar como tirar a vida.


" O que define uma mulher? Muitas respostas poderiam ser dadas a esta pergunta, mas o que caracteristicamente a define é o facto de que a mulher menstrua. E na sua condição plena, ela menstrua regularmente, expressão redundante, pois a palavra menstruação, que significa, literalmente, ‘mudança de lua’, tem como sílaba-raiz mens, mensis, a medida, origem da contagem do tempo, i.é., da regularidade.


A sílaba latina mens forma palavras como medida, dimensão metro, mente, para citar algumas. No sânscrito, a sílaba original era ma, de mãe, mana. Na Suméria, os princípios organizadores do mundo, atributos da deusa Inana, eram os me, sílaba contida no nome de muitas deusas, como Medéia, Medusa, Nêmesis e Deméter. Para as mulheres da Idade da Pedra, o sangue menstrual era sagrado. É provável que a palavra sacramento se origine de sacer mens, literalmente, menstruação sagrada. Um ritual exclusivamente feminino, conhecido pelos gregos como Thesmophoria, mas cuja origem se perde no tempo, era realizado anualmente no período das sementeiras. As mulheres que tinham atingido a idade do sangramento reuniam-se num campo sagrado, e ao primeiro sinal do fluxo menstrual, desciam por uma fenda para levar a sua oferenda às Cobras, as grandes divindades primárias do mundo profundo, que representam o poder regenerador na terra, no campo e no corpo das mulheres.


Mooncup


Ofereciam o melhor leitão da ninhada, cuja carne apodrecida junto ao sangue menstrual era misturada às sementes, que então eram enterradas no campo sagrado, para promover e propiciar uma colheita abundante.


Os antigos ritos de menstruação hindus estão relacionados com Vajravarahi, literalmente ‘Porca de Diamante’, a deusa que rege as divindades femininas iradas, que dançam o campo energético do ciclo menstrual.


Ela é a dançante Dakini vermelha, filha da Deusa Primal do Oceano de Sangue, mais tarde denominado de Soma.


Representando o fluido da vida, o sangue menstrual sempre foi considerado tabu, palavra polinésia que significa ‘sagrado’ e que foi interpretada pelos antropólogos como sendo ‘proibido’. De fato, o sangue menstrual, como o poder de criar vida que conecta as mulheres com o próprio universo, era tabu, isto é, sagrado e portanto proibido àqueles que não menstruassem, como era o caso dos primeiros antropólogos homens.


No mais esotérico dos rituais tântricos, o Yoni Puja, os sucos libertados pela cópula eram misturados com vinho e partilhados pela congregação. O mais poderoso de todos os sucos era aquele obtido quando a yogini estava menstruando.


Ao longo dos milénios, as mulheres têm desaprendido a arte de menstruar, de fluir com a vida. Nas sociedades tribais, a menarca, o início do fluir do sangue, era celebrada com um rito de passagem, auxiliando a menina a realizar a sua entrada para o reino do mana: o poder sagrado transmitido pelo sangue e que tanto podia dar como tirar a vida. Além de apaziguar o poder destruidor, o rito tinha como função auxiliar a menina a entender a sua condição física e a sua relação com a função procriadora da natureza. Ainda uma criança em espírito e condição social, a partir das suas regras, a jovem devia assumir o comando de sua vida. Sem ritos de passagem, o que temos para oferecer às nossas meninas, que as ajude a transformar-se e a assumir a sua nova identidade?


Ao longo do processo civilizacional, a menstruação foi sendo depreciada, relegada, tendo-se tornado um tabu. O que era sagrado tornou-se proibido, sujo, contaminado. A regra passou a ser esconder a regra. O resultado disto foi que o evento central na vida de toda a mulher madura se tornou invisível. Ironicamente, retorna à visibilidade para se tornar um negócio milionário, o dos absorventes ditos ‘higiénicos’, mas que continua a reforçar a ideia de que o sangue menstrual é ‘sujo’. O apelo maior da propaganda de absorventes é tornar a menstruação invisível. Promete que usar tal ou tal marca de absorvente possibilita à mulher levar a vida como se nada estivesse acontecendo em seu corpo. Descaracteriza-a como mulher, negando sua característica mais distintiva.

Devemos abolir os absorventes? É claro que não, pois não vivemos na Idade da Pedra. Mas talvez devêssemos nos espelhar no exemplo das índias andinas, que simplesmente se agacham e deixam o seu sangue fluir para a terra. Impossibilitadas de agir assim numa terra coberta de asfalto, podemos, contudo, transformar esta prática num ritual. É importante para as mulheres recuperarem o sentido sagrado do facto biológico central nas suas vidas. Pois, ainda hoje, a maioria das mulheres ‘emancipadas’ acredita que a suas regras (aquilo que as rege) é uma inconveniência que, se possível, deveria ser eliminada. Se formos capazes de romper com esta crença, talvez possamos desvincular o feminino da ideia de fragilidade e instabilidade. A decantada imprevisibilidade feminina é, em grande parte, decorrente das oscilações a que a mulher está submetida, ao longo de seu ciclo mensal. É a expressão da imprevisibilidade da própria vida. O ciclo hormonal feminino apresenta dois pontos culminantes: a ovulação e a menstruação. O pólo branco da ovulação, chamado muitas vezes de rio da vida, é o pólo ovariano, procriativo, momento do ciclo em que, biologicamente, a mulher se coloca plenamente ao serviço da espécie. O pólo vermelho da menstruação, também chamado de rio da morte, é o pólo uterino, quando a mulher se volta para si mesma. Ou pelo menos deveria, pois a arte de menstruar, a habilidade de fluir com a vida, é o momento em que somos chamadas para dentro, a fim de nos curarmos a nós mesmas.


Desprezada e negligenciada, não é de estranhar que a menstruação revide. A TPM (Tensão entre Patriarcado e Menstruação) é a expressão do conflito que nós mulheres vivemos, entre voltarmo-nos para o acontecimento sagrado dentro de nós ou atender à demanda do mundo externo. O período menstrual torna-nos mais sensíveis, captando os acontecimentos em torno de nós através de uma lente de aumento e reagimos de acordo. Se aprendermos a respeitar o movimento energético que acontece no nosso interior, poderemos usar esta sensibilidade de um modo mais significativo e reverter a depreciação a que o sangramento foi submetido, recuperando a sua sacralidade.

Como mulheres modernas, inseridas num mundo que funciona de acordo com os valores masculinos, nem sempre podemos recolher-nos na cabana da menstruação, como faziam as nossas antecessoras, onde descansavam e partilhavam as suas experiências. Mas podemos reduzir as nossas atividades ao mínimo, deixando para outro momento algumas delas. Também podemos recolher-nos para dentro de nós, enquanto executamos as atividades diárias que nos competem. Depois de cumpridas as tarefas, podemos retirar-nos para um lugar tranquilo e prestar atenção ao que acontece no nosso útero, observar as sensações e os sentimentos, os sonhos que emergem. O período menstrual é o momento em que podemos aprender mais a nosso respeito e curar as nossas feridas. Assim reverenciada, a arte de menstruar pode ser recuperada, possibilitando uma vida mais plena e feliz como mulher.


Nota: Existe a alternativa ao penso higiénico, a mooncup. Veja aqui.
Imagens: Google

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