Hoje em Portugal é o grande dia de Maria, a Senhora de
Fátima, a Nossa Senhora, a Mãe de Jesus, crê-se. Nunca lhe ouvi chamar Deusa, a
não ser uma vez na televisão um padre muito preocupado porque o que se passava
em Fátima era puro paganismo, adoração da Deusa. Não me lembro do nome dele, já
foi há uns 30 anos, mas a verdade é que o indivíduo tinha mesmo razão – quando dizia
ser adoração da Deusa, não quando se mostrava preocupado, óbvio. Como muito bem
lembra Moisés Espírito Santo e outr@s, a religião popular encontrou maneira de
subsistir no seio da viril, seca, sensaborona, rígida e implacável Igreja de Roma
tratando de arranjar nela um lugar de honra para a sua Rica Mãezinha sem a qual
hoje em dia não haveria nada na Igreja Católica capaz de ainda mover multidões
como a que hoje deve ter estado em Fátima e de que também já fiz parte e adorei
a experiência.
Maria de Fátima, entretanto, como os padres a travestiram,
que é exactamente uma versão católica portuguesa daquilo que o lobby gay da
indústria internacional da moda faz com as manequins: pré-adolescentes,
anoréticas, sem resquícios de feminidade no corpo, assexuadas, tendo mais do
rapazinho do que da rapariga (mas esperem lá que isto pode levar-nos muito
longe se lermos “Os Mouros Fatimidas e as Aparições de Fátima” do já referido Moisés
E. Santo…), Maria, enquanto Senhora de Fátima, dizia eu, sejamos realistas,
nada tem de uma Mãe. Só com muito boa vontade e um grande transe de pai-nossos
e ave-marias e muita água benta é que conseguimos ver n’Ela a Grande Criadora
Toda-Poderosa, a Senhora do Grão, da Abundância, da Fartura, capaz de proteger, cuidar e
alimentar as filhas e os filhos, que era assim que Ela, a Deusa, que o povo
levou para a Igreja de Roma, era vista e sentida.
Entretanto o processo por que passou, o lifting, levou-lhe
os benéficos e fecundos atributos maternos que apenas em outras Senhoras muito
mais esquecidas hoje em dia podemos encontrar, como a Senhora do Ó, a Senhora
grávida, e em especial a Senhora do Leite, Essa sim, uma verdadeira Mãe capaz
de alimentar o mundo. O lifting, o processo de emagrecimento, a mastectomia e,
presumo, também a histerectomia por que passou a Virgem Maria, penso que
estarão relacionadas com o profundo ar de apatia depressiva que apresenta e que
estranha e, desconfio que perfidamente, se confunde com santidade (iluminação
em outros credos). Oficialmente é o sofrimento pelos pecados do mundo, contra o
seu Filho, ou seja, todo um programa de manipulação emocional capaz de nos tornar
tão apátic@s e depressiv@s como a sua imagem aparenta, se não tomarmos providências.
Misericórdia, dirão, Compaixão. Concedo. Maria, que é a
Senhora do Mar, do mar das emoções, é uma Deusa da Compaixão, como a oriental
Kuan Yin, uma Mãe capaz de sofrer por nós e de interceder por nós junto do Pai demasiado
severo e ocupado com coisas sérias para directamente atender as suas míseras
criaturas... Tão interessante… sobretudo
quando se diz com desdém que os deuses do Olimpo grego tinham qualidades
demasiado humanas… ahahah! E seriam apenas eles?
Ora ter na cultura como arquétipo feminino dominante uma Mãe,
assexuada, anoréctica, mastectomizada, deprimida, que apenas pode oferecer
compaixão, misericórdia, piedade (acho que é tudo a mesma coisa) às suas
criaturas terrenas, sem qualquer poder para além do de aplacar a
insensibilidade da divindade masculina, é extremamente preocupante e a minha
preocupação é mesmo genuína.
Por que terá Maria, entretanto, esse poder junto
de Deus Pai também é um mistério, uma vez que Ela é tão-somente a Mãe do Seu
Filho, ou seja, Deus é um Pai solteiro que usou o ventre de Maria como única tecnologia
de reprodução disponível. Óbvio que Ela seria de qualidade superior, enquanto
Deus, ele só podia escolher o melhor. Podemos imaginar, por exemplo, o Michael
Jackson a escolher a Mãe que daria à luz os seus preciosos rebentos com um
rigor o mais semelhante que a sua simples humanidade torna possível. Só me
espanta no meio disto tudo é que os cristãos se insurjam tanto contra o direito
dos gays de adoptarem crianças…
E enquanto isso o que
eu faço é procurar as nossas antigas Deusas Mães capazes de nos valerem, ajudando
a empoderar a Mãe em nós e no mundo para ver se pomos alguma ordem na grande casa
humana.
©Luiza Frazão