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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

SANTA BRÍGIDA - THE IBERIAN CONNECTION

A verdade é que talvez não seja assim tão estranha a vinda desta relíquia (a cabeça de santa Brígida) para Portugal e a pedido de D. Dinis, pois afinal este nosso território terá pertencido ao mesmo universo mítico de que fazia parte esta deusa tornada santa, cuja figura e o destacado valor atribuído a cabeça – fenómeno integrado no culto das cabeças – representam apenas a ponta de um icebergue chamado celtismo.

Celtismo esse que reivindicamos como uma possível realidade histórica, assente sobretudo em dados arqueológicos, genéticos, linguísticos, antropológicos ou etnológicos, os mesmos de que nos temos servido ao longo de trabalhos anteriores e que, neste caso, continuam a ser válidos. Desses dados faz parte também a tradição mítica, tanto irlandesa, como escocesa, que diz dever a sua própria fundação a descendentes de príncipes ibéricos, designadamente Gatelo ou Mil, os chamados Milesianos, provenientes da Península Ibérica, onde também tinham fundado Portugal, em 1553 a. C.107.

E a força desta tradição é tanta nos países britânicos que a pedra (dita fadada) onde Gatelo aqui se sentava para fazer justica e receber a vassalagem dos seus súbditos terá sido levada, segundo a lenda, primeiro para a Irlanda, depois para a Escócia e, por fim, para Inglaterra. Tomou o nome de Lia Fail ou Pedra da Coroação e sobre ela se coroavam (e coroam) os reis legítimos: ainda hoje existe, guardada na Escócia, e continua a desempenhar a mesma função, pois será trazida para Inglaterra para coroar o rei sucessor de Isabel II.

Mas recuando, ainda mais, ao “refugio ibérico”, um dos locais mais importantes da Europa onde o Homo sapiens sapiens se reuniu para sobreviver à glaciação, até há 16 ou 17 mil anos, quase nos atrevemos a dizer que a afirmação da vinda da cabeça de Santa Brígida para ser entregue a D. Dinis, rei de Portugal, é o vestígio simbólico de um “regresso às origens” do mito.

Nessa época longínqua e de difícil sobrevivência estávamos “num tempo em que o mito e o rito eram o sistema fundamental de representação e organização do universo mental da humanidade e a consciência assumia de facto a forma e o conteúdo do património tradicional dos contos e dos rituais colectiva e individualmente próprios de uma dada população. [...] o corpo mítico-ritual assegurava, assim, a sobrevivência do grupo[...]”.

E acerca do fenómeno do mito e da sua transmissão, de forma ritmada e rimada para mais fácil memorização, também as ciências cognitivas afirmam que um povo sem mitos nunca teria sobrevivido às ásperas condições de então. Assim, mito e celtismo serão as duas faces da mesma moeda que estão na base da Historia e da tradição deste vasto território ocidental europeu de que fazemos parte. E que estarão na base deste fenómeno de uma deusa/santa em Lisboa.

O eco que encontrou, aqui em Lisboa, a cabeça da padroeira irlandesa com toda a panóplia dos rituais seus derivados – que a seguir desenvolveremos – enquadra-se, assim, de um modo mais compreensivo, na nossa cultura medieva, herdeira dessa história e tradição.

Gabriela Morais, Lisboa Guarda Segredos Milenares, Santa Brígida, uma Deusa Celta em Lisboa
http://www.continuitas.org/texts/morais_lisboa.pdf

Imagem: Bridget, de Caroline Gully-Lir
http://www.spinningthewheel.com/

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