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terça-feira, 19 de novembro de 2013

REIS DA CRIAÇÃO POR DIREITO DIVINO

Encontrei há pouco uma foto do Ernest Hemingway e da modelo Jean Petchett e achei-a perfeita para ilustrar este excerto do Segundo Sexo, ou talvez até o livro inteiro... 

"Em toda parte e em qualquer época, os homens exibiram a satisfação que tiveram de se sentirem os reis da criação. "Bendito seja Deus nosso Senhor e o Senhor de todos os mundos por não me ter feito
mulher", dizem os judeus nas suas preces matinais, enquanto as suas esposas murmuram com resignação: "Bendito seja o Senhor que me criou segundo a sua vontade". Entre as mercês que
Platão agradecia aos deuses, a maior se lhe afigurava o fato de ter sido criado livre e não escravo e, a seguir, o de ser homem e não mulher. Mas os homens não poderiam gozar plenamente esse privilégio, se não o houvessem considerado alicerçado no
absoluto e na eternidade: de sua supremacia procuraram fazer um direito. "Os que fizeram e compilaram as leis, por serem homens, favoreceram seu próprio sexo, e os jurisconsultos transformaram
as leis em princípios", diz ainda Poulain de Ia Barre.

Legisladores, sacerdotes, filósofos, escritores e sábios empenharam- se em demonstrar que a condição subordinada da mulher era desejada no céu e proveitosa à terra. As religiões forjadas pelos homens refletem essa vontade de domínio: buscaram argumentos nas lendas de Eva, de Pandora, puseram a filosofia e a

teologia a serviço de seus desígnios, como vimos pelas frases citadas de Aristóteles e São Tomás."

Simone de Beauvoir, O Segundo Sexo

terça-feira, 12 de novembro de 2013

MULHERES EM BRANCO - A UNIVERSALIDADE DA BEAN SIDHE DA TRADIÇÃO CELTA


Versão portuguesa:

 MULHERES EM BRANCO

 Uma mulher misteriosa, vestida de branco, anunciadora da morte, em pranto, é uma figura bem conhecida na tradição celta, a Bean Sidhe. No entanto, esta mulher não é um exclusivo do folclore celta. As suas irmãs parecem estar espalhadas por todo o lado, como é o caso de La Llorona no México, de La Sayona na Venezuela, de Paquita Muñoz nos Andes e de a Mulher de Branco no Brasil e em Portugal...
 O branco que ela usa é tudo menos um símbolo de pureza e de inocência e as suas histórias dramáticas e dolorosas parecem estar sempre associadas a um homem de quem ela procura vingar-se. O fantasma desta mulher atormenta e aterroriza incautos condutores em nocturnas estradas isoladas.
 Nesta comunicação tentaremos perceber de que modo estas Mulheres de/em Branco estão conectadas com as profundezas ignoradas da nossa alma.

domingo, 10 de novembro de 2013

A ÉPOCA PAGÃ NÃO FOI UMA ÉPOCA DE CAOS E DE TREVAS, COMO HABITUALMENTE SE SUPÕE


Por que é que continuamente se infere que a época pagã, o tempo em que eram cultuadas divindades femininas (quando esse tempo é mencionado), é como uma época de trevas, de caos, de mistério e de mal, sem a luz da ordem e sem a razão que supostamente foram depois trazidas pelas religiões masculinas? As pesquisas arqueológicas entretanto confirmam que as primeiras leis, formas de governação, medicina, agricultura, arquitectura, metalurgia, veículos de rodas, cerâmica, têxteis e escrita foram inicialmente desenvolvidas em sociedades que seguiam a religião da Deusa. E finalmente acabamos por nos questionar sobre as razões para a falta de informação facilmente acessível sobre sociedades que, durante milhares de anos, cultuaram a antiga Criadora do Universo. 

Apesar dos muitos obstáculos, consegui reunir a informação existente e comecei a relacionar entre si o que tinha recolhido. À medida que fui investigando, a importância, a longevidade e a complexidade desta religião antiga começou a tomar forma diante de mim. Muitas vezes havia apenas a referência à Deusa, um pedaço de lenda, uma referência obscura ao longo das 400 ou 500 páginas de erudição académica. Um templo abandonado em Creta ou uma estátua no museu de Istambul com escassa informação a acompanhá-la começaram entretanto a encontrar o seu lugar próprio num cenário mais vasto.


Merlin Stone, When God Was a Woman, traduzido por Luiza Frazão