Os antigos acadianos deixaram escrito que a Deusa conhecida como
Mami arrancou catorze pedaços de barro e transformou sete deles em mulheres e
sete deles em homens. Ela criou a vida sobre a terra. No Daomé considerava-se
que a Deusa conhecida como Mawu havia construído as montanhas e os vales,
colocado o sol no céu, e que a vida na terra tinha sido criada por ela. Os
textos chineses registam que a Deusa conhecida como Nu Kwa remendou a terra e
os céus, quando estes foram despedaçados, e assim restaurou a harmonia e o
equilíbrio no universo. Registos mexicanos revelam que a Deusa conhecida como
Coatlicue viveu no alto de uma montanha, numa nuvem, e lá ela deu à luz a
lua, o sol e todas as outras divindades. Hesíodo escreveu que a Deusa conhecida
como Gaia deu à luz o céu e, acasalando-se com ele, deu à luz as outras
divindades. Os textos sumérios dizem-nos que a Deusa conhecida como
Nammu foi
considerada a mãe que deu à luz o céu e a terra, e que Ela supervisionou a
criação da vida por sua filha Ninmah. Os australianos explicam que é à Deusa
conhecida como Kunapipi, que o nosso espírito retorna após a morte,
permanecendo com Ela até ao renascimento seguinte. Nos hieróglifos egípcios,
estava escrito que a Deusa conhecida como Au Sept era a mais antiga das antigas, Aquela da qual tudo proveio.
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Deusa Chinesa Nu Kwa |
Estas são apenas algumas imagens da mulher como divindade,
força primordial da existência, como é concebida por várias culturas. Será
completamente coincidência que a multiplicidade de relatos da mulher como
divindade tenha sido classificada como “mitologia” em vez de como escritura
sagrada e religiosa? Parece haver poucas pessoas nas sociedades ocidentais
contemporâneas que sejam capazes ou estejam dispostas a perceber as histórias da
criação e os relatos de divindades, que foram escritos em tabuletas de argila
ou papiros por culturas antigas, como conceitos verdadeiramente “religiosos”...
separados por geografia, cultura ou cronologia. Eles revelam contemplações
espirituais e conceitos religiosos que se desenvolveram nessas culturas em todo
o mundo, assim como as histórias das Escrituras Hebraicas se desenvolveram na
sociedade primitiva, o Novo Testamento na sociedade cristã primitiva e o
Alcorão na sociedade islâmica primitiva. Alguns afirmam que é uma certa
qualidade “primitiva”, uma “irracionalidade” nos eventos e imagens, que definem
um relato como mito. No entanto, quantas das pessoas que fazem essas afirmações
e criam essas definições se referem ao relato da criação no livro de Gênesis,
ao relato da abertura do Mar Vermelho, ou ao relato de Jesus andando sobre as
águas e alimentando cinco mil pessoas com cinco pães e dois peixes como
mitologia? Todos esses relatos espirituais são experiências e expressões das
culturas do seu tempo. O que antes era desconsiderado como “mito” precisa de
ser reivindicado como verdade cultural, religiosa e espiritual.
Texto elaborado por Jennifer Murphy, @primalwaters, com base no trabalho de Merlin Stone (1984) Ancient Mirrors
of Womanhood (Antigos Espelhos da Feminilidade)
Tradução de Luiza Frazão
Imagem 1: Grupo de antigas representações da Deusa provenientes da Síria, terceiro e segundo milénio antes da nossa era.
Imagem 2: Nu Kwa (clique sobre a imagem)
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