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Assim, em relação ao comportamento
de qualquer outra espécie conhecida, é óbvio que o estupro da fêmea pelo macho é
pura aberração que coloca o homem patriarcal num grau de desenvolvimento
pré-humano (ou seria anti-humano?).
Aberração pura, pois, só pode ser a qualificação do uso que
o homem patriarcal, em determinadas circunstâncias, parece fazer do seu pénis. Para além dos fins normais para que foi feito, o pénis parece ser usado em
algumas circunstâncias, como uma arma, de que a espada é um símbolo e uma representação
do poder letal (veja-se o uso da violação em cenários de guerra). Quando,
entretanto, ficamos a conhecer alguma da patética argumentação machista (tanto
de homens quanto de mulheres patriarcais, diga-se) sobre o comportamento
culpável e “provocador” das vítimas de violação, ficamos com a impressão de
que, sim, o homem patriarcal, parece
cinicamente pretender usar o seu pénis/espada com propósitos que seriam de controlo, quase poderíamos dizer educativos, numa pretensa ânsia de fazer justiça e de impor moral,
uma moral que, claro, as mulheres, vistas como sua propriedade e território, postas
por Deus no mundo para os servirem, precisam, elas sim, de estritamente
observar.O estupro, segundo esta ordem de ideias, teria então, pasme-se, uma função normativa...
A moralidade que o homem patriarcal deseja então impor com o
seu pénis transformado em espada justiceira e edificativa, condena a mulher por andar
sozinha à noite, isso é uma prerrogativa masculina. Ela não pode beber, nem ter
comportamentos excessivos, embriagar-se é outra prerrogativa masculina. Também não
pode andar com menos roupa, andar de tronco nu é mais uma regalia masculina, e
o corpo da mulher é objeto de tentação, ponto final. O corpo do homem não é objeto
de tentação para a mulher, nem para outro homem, porque o sujeito da cultura é
o homem patriarcal, que, pelo menos oficialmente, é heterossexual, o CIS, segundo
designação mais actual.
Isto vem aturando há milénios a fêmea da espécie, vivendo uma
condição, não de ser humano de pleno direito, que é essencialmente um ser
experimental, mas sujeita a um estrito programa que lhe tem imposto rigorosos
limites, tanto ao autoconhecimento quanto à autoexpressão.
Subitamente, porém, talvez devido à conjuntura astral, explosões de
incontida ira de mulheres muito jovens na sua maioria, com consciência de si
mesmas enquanto parte dum grupo humano, que sendo maioritário, é tratado como
minoritário, secundário, irrelevante e descartável, gritando que “Feminismo é
evolução” fazem estremecer as praças. Era tempo. Mas…“As meninas vão exceder-se...”,
dizem algumas vozes… Pois, é possível, como seres experimentais que são, que
somos; “Vão assumir posturas patriarcais, copiadas dos homens, em relação ao
sexo!" A mesma voz de sempre gritando: “Compostura!”,
meninas bem-comportadas não fazem… isto ou aquilo. Quase se ouvindo o coro da tragédia: “Esses excessos tiram-vos a razão”… Não tiram, nada lhes tira a razão. Mas lá está... o mesmo nível de exigência de sempre em relação às mulheres, a vontade de as
proteger, porque não vão ser capazes… não vão poder manter a pose no retrato
de família que alguém fez para elas, não vão poder estar à altura de toda a
idealização de que passivamente têm sido objeto ao longo da história
patriarcal… ou, pior ainda, não vai haver ninguém sóbrio para nos levar para casa nem para a governar...
Pessoalmente, gostei do que vi, e acalento a esperança de
que a mesma veemência que põem agora na defesa dos seus corpos de mulheres a
apliquem à defesa do corpo da Mãe Terra. Abençoadas!
Luiza Frazão
Luiza Frazão