A lua tornou-se uma
das imagens centrais da espiritualidade da Deusa. No entanto... precisamos de examinar
a sua potência contra-imaginal - o sol. Se a Deusa deve estar totalmente
representada na nossa sociedade, ela também deve ser a luz que guia e o calor da
nossa vida consciente. O Sol não deve ser considerado apenas como um símbolo
patriarcal irrecuperável, mas como uma representação da vida e do alegre prazer
da Deusa.
Quase sempre a resposta seria que o sol é masculino e a lua
feminina. Na verdade, a lua é talvez o símbolo mais conhecido do divino feminino
na actual espiritualidade da Deusa. No entanto, se tivesses feito a mesma
pergunta a uma pessoa pagã do passado, terias muito provavelmente tido uma
resposta diferente. Enquanto na Grécia e em Roma se reverenciava a lua como
Artemis e Diana e o sol como Hélios e Apolo, o conceito dum sol masculino e
duma lua feminina não era universalmente partilhado em todos os sistemas
mitológicos. Das tribos celtas ao povo Inuit da América do Norte, o sol era
visto mais frequentemente como uma deusa do que como um deus.
Então como é que hoje em dia vemos o sol como sendo
exclusivamente masculino? Quando comparamos os papéis e géneros das luminárias
entre culturas, torna-se claro que as nossas antepassadas e os nossos
antepassados pagãos não conseguiam atingir a unanimidade sobre a questão do sol
ser masculino e a lua feminina. Encontramos panteões que cultuavam deuses
solares e deusas lunares e outros que viam o sol como feminino e a lua como
masculina.
Parece que o povo celta não conseguia decidir-se nesta
matéria, tendo numerosas deusas lunares mas também deusas solares, que coexistiam
com deuses solares. De forma semelhante, no Egipto também havia deuses e deusas
solares. Assim sendo, se algumas culturas veneravam o sol como uma deusa e
outras como um deus, e outras ainda como deus ou como deusa, por que razão é
que hoje em dia o conceito de sol feminino nos parece tão pouco familiar?
Em última análise, o conceito do sol como exclusivamente
masculino é bastante recente e a origem desta classificação exclusiva remonta à
época vitoriana.
Apesar da deusa solar parecer um conceito estranho para
muitas e muitos de nós, ela está mais presente no paganismo moderno do que
aquilo que poderíamos supor, apenas não a classificamos como tal. Com efeito,
Brígida, uma das deusas mais populares do panteão celta e cujo festival o
paganismo celebra a cada Imbolc, tem inúmeros atributos solares. Apesar disso,
Brígida é habitualmente referida como deusa do fogo e da inspiração, nunca como
uma deusa solar.
As suas conexões solares permaneceram até nas histórias de
santa Brígida, a versão cristianizada da deusa. Santa Brígida veio ao mundo ao
nascer do sol e a casa onde nasceu brilhava com tal intensidade que a vizinhança
pensou haver um incêndio, mas quando foram ver, essa luz que viam emanava da
própria santa. Também se diz que um dia ela suspendeu a sua capa de um raio de
sol. Era ainda sobejamente conhecida a sua habilidade para curar a cegueira,
uma capacidade comum às deusas solares, uma vez que o sol era considerado uma
espécie de “olho” no céu.
Interessante é ainda o facto de tanto o nome irlandês como aquele
que era usado no inglês antigo para designar o sol era feminino, indicando que
estes povos viam o sol como uma força feminina. Sem esquecer que a cruz de
Brígida não passa duma representação simbólica do sol.
In Drawing Down the Sun, Rekindle the Magic of
the Solar Goddess, Stephanie Woodfield, 2014
Imagens:
Imagem 1 - https://druidry.org/resources/brigid-survival-of-a-goddess
Imagem 2 - https://www.pinterest.co.uk/catnewell1/goddess/