De Santa (qadesh)
a Rameira (Harlot)
Lendo Merlin Stone, a famosa autora de When God Was a Woman (Quando Deus era Mulher)... A obra que tenho em
mãos é The Paradise Papers - The
Suppression of Women’s Rites (Os papéis do Paraíso- a Supressão dos Ritos Femininos).
Como se diz na capa, um “clássico feminista”…
Merlin Stone revela aqui o que encontramos quando um novo olhar,
um olhar feminino, ou feminista, é lançado sobre documentos antigos. Um crivo de preconceitos patriarcais é usado pelos arqueólogos académicos, segundo aqui se demonstra, para
interpretarem dados do passado… muito interessante e revelador.
Fica aqui uma amostra:
Fica aqui uma amostra:
“Na maior parte dos textos arqueológicos, a religião centrada
numa divindade feminina é referida como um simples “culto de fertilidade”,
parecendo tal classificação revelar atitudes em relação à sexualidade que
decorrem da influência da visão das religiões contemporâneas professadas pelos
próprios autores. No entanto a evidência arqueológica e mitológica da veneração
duma divindade feminina enquanto criadora, legisladora, inventora, profetiza,
com influência no destino humano, inventora, curadora, caçadora e líder
imponente no campo de batalha sugere que a designação “culto de fertilidade”
não passa duma simplificação grosseira duma complexa estrutura teológica.
(…)
Nas suas descrições de cidades e de templos há muito
soterrados, os académicos homens escreveram sobre a sexualidade activa da Deusa
como sendo “indecente”, “intoleravelmente agressiva” “embaraçosamente vazia de
moral”, enquanto as divindades masculinas que seduziam e violavam ninfas ou mulheres
míticas, são descritas como “brincalhonas” ou até admiravelmente “viris”. A
evidente natureza sexual da Deusa, justaposta à Sua sagrada divindade confundiu
de tal forma um académico que este acabou por decidir-se pelo desconcertante
epíteto de Virgem-Rameira. As mulheres que seguiam os antigos hábitos sexuais
do culto da Deusa, designadas na sua própria língua como sagradas ou santas mulheres,
foram repetidamente classificadas como “prostitutas ritualísticas”. Esta selecção
de palavras é reveladora uma vez mais duma ética etnocêntrica provavelmente
baseada em atitudes bíblicas. Acrescente-se ainda que usar o termo “prostituta”
para designar mulheres cujo título era na verdade qadesh, que significava santa, revela uma enorme falta de
compreensão da verdadeira estrutura social e teológica que estes autores estão
a tentar descrever.
As descrições da divindade feminina como criadora do
universo, inventora, dispensadora de cultura, são feitas habitualmente em uma
ou duas linhas se tanto; os académicos rapidamente passam por cima destes
aspectos da divindade feminina que segundo eles não merecem sequer discussão.
Apesar do facto de o título da Deusa em muitos documentos
históricos do Médio Oriente ser Rainha dos Céus, alguns autores apenas parecem
dispostos a conhecê-la como Mãe Terra…
A divindade
feminina, venerada como guerreira ou caçadora, lutadora corajosa ou ágil
atiradora, foi por vezes descrita como possuindo curiosos “atributos masculinos”,
implicando isso que a Sua força e valor a tornavam uma espécie de aberração, ou
alguém psicologicamente anormal. O professor de Arqueologia Pré-histórica J.
Maringer rejeita a ideia de que os crânios de rena fossem troféus de caça duma
tribo paleolítica. A razão? Foram encontrados no túmulo duma mulher. Escreve
ele: “Aqui o esqueleto era o de uma mulher, uma circunstância que parece
descartar a hipótese dos crânios e hastes de rena serem troféus de caça”.
Estarão estes autores a julgar a natureza física intrínseca da mulher pelos modernos
ideais de esbelteza e fragilidade?”
Merlin Stone, The Paradise Papers (tradução de Luiza Frazão)
Merlin Stone, The Paradise Papers (tradução de Luiza Frazão)
Imagem do centro: Deusa Tanit
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