A 17.ª Conferência da Deusa de Glastonbury acabou no domingo
por volta das quatro da tarde. Depois disso, desmontámos o cenário e na 2.ª
feira às 19 e 30 foi a cerimónia de Lammas no Goddess Hall. O tema deste ano
foi a Mãe, a energia da Criadora, daquela face da Deusa que nutre, que suporta
a manifestação, a vida. Os amarelos e os
dourados prevaleciam sobre todas as cores. Cores da abundância e da riqueza.
Mas aí, na energia da Mãe, nem tudo foi colo, aconchego,
nutrição, generosidade… Foi primeiro o doloroso recordar das feridas da Mãe, a
Mater Dolorosa em nós. Nós filhas, nós mães… Como cuidamos ou negligenciamos,
como fomos cuidad@s ou negligenciad@s … Cada ferida se abrindo, cada uma se
oferecendo à consciência/cura… Ir fundo
no abandono, ir fundo na consciência da criança em nós que pede colo, ir fundo
na consciência da Mãe ferida em nós que aprendeu a dar, dar, dar como única
forma de pagar o seu direito de estar viva… Até que nas feridas abertas a Deusa
lança o seu bálsamo e começas a fluir leve no amor, na alegria, na graça e na
beleza do Feminino… Realizas como é justo e natural cultuar uma Criadora cujo
corpo se abre para dele sair a vida, a vida que foi fabricada no seu corpo, com
a sua própria substância…
Na noite depois da abertura, no Drama Sagrado Mother
Matters, dirigido por Katie Player, dezasseis mulheres, à semelhança de
Monólogos da Vagina, contaram-nos as suas histórias reais enquanto mães ou
enquanto filhas, guiando-nos com graça pelos seus meandros mais obscuros, onde
por vezes se podia ouvir o coro da tragédia ou o coro dos anjos, das fadas, dos
unicórnios, nas dimensões aonde brincam agora os espíritos bem-amados…
Depois dessa noite, o tom das Senhoras de Avalon estava dado:
não há por onde fugires, nem penses em fazer de conta, não vale virares a cara…
Vais viajar pelos três mundos em segurança, é só veres como fazemos, repara
bem, nós vamos à frente, abrimos-te o caminho… follow us, sister… vai com
confiança aos teus infernos mais privados, onde serás acolhida pela toda-poderosa
Keridween com o seu caldeirão de morte, transformação e renascimento…
Foi muita Mãe, sem dúvida, mas não tanto como na nossa
cultura patriarcal onde este é o arquétipo feminino mais estimulado, validado, usado
e abusado… Muito peso. A Mãe suporta
aqui, na nossa cultura… o insuportável…
E foi por isso que o trabalho da californiana Ava sobre o arquétipo da
Rainha soube tão bem. Durante mais de duas horas, explorámos a riqueza do único
arquétipo do Feminino que não pode coexistir com o patriarcado e que tem sido
portanto o mais difamado e atacado. Aquela que governa, que conduz a energia,
tem o poder de pura e simplesmente não a dar a seja o que for que, com o seu
apurado discernimento, não lhe pareça ser a favor do bem maior, sendo que a Rainha
em nós é o arquétipo mais impessoal, a que vê the big picture… Amei!
Luiza Frazão
Imagens: Sacred Drama, Mother Matters e altar principal
Imagens: Sacred Drama, Mother Matters e altar principal