Conteúdos

terça-feira, 13 de maio de 2014

RESGATAR MARIA, EMPODERAR A MÃE


Hoje em Portugal é o grande dia de Maria, a Senhora de Fátima, a Nossa Senhora, a Mãe de Jesus, crê-se. Nunca lhe ouvi chamar Deusa, a não ser uma vez na televisão um padre muito preocupado porque o que se passava em Fátima era puro paganismo, adoração da Deusa. Não me lembro do nome dele, já foi há uns 30 anos, mas a verdade é que o indivíduo tinha mesmo razão – quando dizia ser adoração da Deusa, não quando se mostrava preocupado, óbvio. Como muito bem lembra Moisés Espírito Santo e outr@s, a religião popular encontrou maneira de subsistir no seio da viril, seca, sensaborona, rígida e implacável  Igreja de Roma tratando de arranjar nela um lugar de honra para a sua Rica Mãezinha sem a qual hoje em dia não haveria nada na Igreja Católica capaz de ainda mover multidões como a que hoje deve ter estado em Fátima e de que também já fiz parte e adorei a experiência.

Maria de Fátima, entretanto, como os padres a travestiram, que é exactamente uma versão católica portuguesa daquilo que o lobby gay da indústria internacional da moda faz com as manequins: pré-adolescentes, anoréticas, sem resquícios de feminidade no corpo, assexuadas, tendo mais do rapazinho do que da rapariga (mas esperem lá que isto pode levar-nos muito longe se lermos “Os Mouros Fatimidas e as Aparições de Fátima” do já referido Moisés E. Santo…), Maria, enquanto Senhora de Fátima, dizia eu, sejamos realistas, nada tem de uma Mãe. Só com muito boa vontade e um grande transe de pai-nossos e ave-marias e muita água benta é que conseguimos ver n’Ela a Grande Criadora Toda-Poderosa, a Senhora do Grão, da Abundância, da Fartura, capaz de proteger, cuidar e alimentar as filhas e os filhos, que era assim que Ela, a Deusa, que o povo levou para a Igreja de Roma, era vista e sentida.

Entretanto o processo por que passou, o lifting, levou-lhe os benéficos e fecundos atributos maternos que apenas em outras Senhoras muito mais esquecidas hoje em dia podemos encontrar, como a Senhora do Ó, a Senhora grávida, e em especial a Senhora do Leite, Essa sim, uma verdadeira Mãe capaz de alimentar o mundo. O lifting, o processo de emagrecimento, a mastectomia e, presumo, também a histerectomia por que passou a Virgem Maria, penso que estarão relacionadas com o profundo ar de apatia depressiva que apresenta e que estranha e, desconfio que perfidamente, se confunde com santidade (iluminação em outros credos). Oficialmente é o sofrimento pelos pecados do mundo, contra o seu Filho, ou seja, todo um programa de manipulação emocional capaz de nos tornar tão apátic@s e depressiv@s como a sua imagem aparenta, se não tomarmos providências.

Misericórdia, dirão, Compaixão. Concedo. Maria, que é a Senhora do Mar, do mar das emoções, é uma Deusa da Compaixão, como a oriental Kuan Yin, uma Mãe capaz de sofrer por nós e de interceder por nós junto do Pai demasiado severo e ocupado com coisas sérias para directamente atender as suas míseras criaturas... Tão interessante…  sobretudo quando se diz com desdém que os deuses do Olimpo grego tinham qualidades demasiado humanas… ahahah! E seriam apenas eles?

Ora ter na cultura como arquétipo feminino dominante uma Mãe, assexuada, anoréctica, mastectomizada, deprimida, que apenas pode oferecer compaixão, misericórdia, piedade (acho que é tudo a mesma coisa) às suas criaturas terrenas, sem qualquer poder para além do de aplacar a insensibilidade da divindade masculina, é extremamente preocupante e a minha preocupação é mesmo genuína. 

Por que terá Maria, entretanto, esse poder junto de Deus Pai também é um mistério, uma vez que Ela é tão-somente a Mãe do Seu Filho, ou seja, Deus é um Pai solteiro que usou o ventre de Maria como única tecnologia de reprodução disponível. Óbvio que Ela seria de qualidade superior, enquanto Deus, ele só podia escolher o melhor. Podemos imaginar, por exemplo, o Michael Jackson a escolher a Mãe que daria à luz os seus preciosos rebentos com um rigor o mais semelhante que a sua simples humanidade torna possível. Só me espanta no meio disto tudo é que os cristãos se insurjam tanto contra o direito dos gays de adoptarem crianças…

Mas Maria nunca poderá aspirar ao estatuto de Deusa, a menos que nós o decidamos. Nós, mulheres, que há que ter mão nisto, e foi o que fez ontem Marion Brigantia numa cerimónia no Templo da Deusa de Glastonbury em que eu não participei por ainda não ter sentido que para mim chegou esse momento. Só para mim, só eu sentir-me mais conectada com a energia de Maria. Processos que às vezes podem demorar.

 E enquanto isso o que eu faço é procurar as nossas antigas Deusas Mães capazes de nos valerem, ajudando a empoderar a Mãe em nós e no mundo para ver se pomos alguma ordem na grande casa humana.
©Luiza Frazão